Cotidiano

Araupel: Mais de 400 empresas fecham e reivindicam reintegrações

Lentidão do governo do Estado cria cenário de desespero na cidade

Quedas do Iguaçu – Mesmo em uma época em que cada real conta no caixa das empresas, mais de 400 fecharam as portas ontem para defender as reintegrações de posse de áreas da Araupel invadidas por sem-terra. Há uma semana diferentes setores da economia do município protestam para cobrar do governo estadual o cumprimento de determinações da Justiça.

As manifestações começaram semana passada com os transportadores autônomos de madeira e ontem envolveram inclusive comércio e escolas. O consenso é de que a crise afeta a todos, indistintamente.

A sugestão de fechamento das empresas, em apoio aos transportadores e aos funcionários da Araupel que correm o risco de perder seus empregos, foi feita na tarde de terça-feira pela Aciqi, a Associação Comercial e Empresarial de Quedas do Iguaçu.

“A situação é desesperadora. Alguém tem que tomar uma providência e devolver a paz a essa gente. O que está acontecendo aqui é uma lamentável atrocidade de direitos”, afirmava ontem um dos diretores da entidade, que por questão de segurança preferiu preservar sua identidade.

Patrões e empregados não abriram as empresas, mas vestiram as cores de Quedas em um protesto raras vezes visto na história do município.

“Todas as pessoas que trabalham, que escolheram esse município para morar e que gostam daqui estão arrasadas com a situação. Precisamos de segurança, de garantias do Estado de que nossas vidas poderão voltar ao normal”, diz a dona de uma loja de confecções que gera três empregos.

“As vendas caíram drasticamente nos últimos meses. Não sei como vou pagar os próximos salários e os impostos, que são elevados. Se nada ocorrer nos próximos dias, talvez eu tenha de fechar a empresa”, lamenta ela, que também tem medo de virar alvo dos sem-terra.

Do lado da lei

Desde que a crise das invasões começou, e foi agravada com as duas mais recentes ocorridas em intervalo de um ano, muita gente optou por deixar a cidade.

“Mas nem todos podem e querem fazer o mesmo. Precisamos convencer o governador e as autoridades que estamos do lado da lei e precisamos ser protegidos. Caso isso não ocorra, então todo o discurso democrático que ouvi nos últimos 30 anos não faz nenhum sentido”, lamenta outro dos diretores da Aciqi, que também participou da manifestação de ontem. Com faixas e cartazes, a comunidade apela para que as reintegrações sejam feitas o mais rapidamente possível.

Risco iminente de demissões

Centenas de famílias de sem-terra, algumas provenientes até do Paraguai, invadiram duas áreas produtivas da Araupel em julho de 2014 e em julho de 2015. A empresa é uma das maiores de Quedas do Iguaçu e dá emprego a mais de 1,2 mil trabalhadores.

Desde o início de outubro, sem-terra bloqueiam acesso às áreas de corte de madeira. Sem matéria-prima para beneficiar, setores do reflorestamento e da indústria estão parados. Há risco iminente de mais de 200 trabalhadores serem demitidos.

As primeiras invasões a áreas da empresa ocorreram na metade da década de 1990. Desde então, cinco invasões foram registradas e mais de 50 mil dos 80 mil hectares da Araupel foram destinados à reforma agrária.

Mesmo assim, líderes do MST decidiram que querem também o resto sem se importar com as consequências sociais e econômicas que a medida trará. A Justiça concedeu reintegrações de posse à empresa nos mesmos dias da invasão, mas o governo estadual resiste em cumprir as reintegrações.

Vários dos lotes do Assentamento Celso Furtado foram reintegrados porque seus novos donos os venderam ignorando que essa postura é vedada pela política nacional de reforma agrária.

Há denúncia de que pelo menos 50% dos 1,1 mil lotes do assentamento, criado em área que antes pertencia à Araupel, já foram comercializados ilegalmente. Líderes do MST em Quedas não foram localizados para comentar as denúncias nem o protesto do comércio.