Agronegócio

Onda de protestos na Europa: Especialista aponta reflexos ao agro brasileiro

Engenheiro agrônomo Marcos Jank, do Insper
Engenheiro agrônomo Marcos Jank, do Insper

Escorados no argumento de rigidez na legislação ambiental e burocracia excessiva, os agricultores da União Europeia desencadearam uma onda intensa de protestos mais intensa na França e reverberando na Itália, Polônia, Romênia, Grécia, Alemanha, Portugal e nos países baixos. A agricultura responde por 1,4% do PIB (Produto Interno Bruto) da UE.
Os protestos eclodiram no começo do mês, quando líderes se reuniam em uma importante cúpula para debater sobre a Ucrânia. Entre os principais descontentamentos dos agricultores europeus, consta o alto custo da energia elétrica, alta dos insumos e o encarecimento do transporte, agravado após a guerra travada entre Rússia e Ucrânia. Produtores mais revoltados bloquearam vias importantes e protestaram atirando ovos e até esterco em frente às instituições públicas e bancárias em países europeus.
O Brasil é dos maiores exportadores da União Europeia. Aproveitando a presença do especialista em economia agrícola e comércio internacional e coordenador do Centro de Agronegócio Global do Instituto de Estudo e Pesquisa Insper, Eng. Agr. Marcos Jank, no Show Rural Coopavel deste ano, a reportagem do Jornal O Paraná procurou entender melhor os reflexos desses protestos no País. “Hoje, essa questão da Europa é relevante. Apesar de hoje depender bem menos da Europa no que tange às exportações [no passado esse percentual já foi de 50%], atualmente, corresponde a 15%, 16%”, comenta ele.

US$ 25 bilhões\Ano
A Europa compra ao ano US$ 25 bilhões de produtos do agronegócio brasileiro. “Estamos há mais de duas décadas negociando o Acordo União Europeia e Mercosul e até então, havia uma sensação de que poderíamos selar essa negociação nesse governo” salienta. Quando o diálogo já estava bem adiantando, os agricultores iniciam uma mobilização em massa e uma onda de protestos, alegando principalmente a concorrência desleal das importações provenientes do Brasil, do Mercosul e da Ucrânia. “Eles (agricultores) mencionam explicitamente o fato que a União Europeia concedeu acesso livre aos produtos da Ucrânia, depois da invasão da Criméia pela Rússia. Isso acabou atrapalhando e fez com que os agricultores da Polônia e da Romênia reclamassem da Ucrânia e, no nosso caso, quem mais reclama são os próprios franceses, contrários ao acordo”.
O presidente francês, Emmanuel Macron, já antecipou: “Não há espaço para terminar essa negociação, apesar dessa espera de 22 anos”. Conforme Jank, há uma resistência em fazer o acordo. “Eles tentar encontrar um bode expiatório dizendo que o problema é nosso [Brasil] ou é lá da Ucrânia”. Entretanto, o problema deles é interno. “A agricultura europeia está envelhecida. Os jovens não querem ficar no meio rural, mesmo recebendo subsídios. A legislação ambiental europeia exige a redução do uso de fertilizantes, pesticidas e tem agido com rigor em relação ao uso de água e esterco”.
Os agricultores europeus também não concordam com a destinação de 4% de suas áreas para preservação ambiental. “A nossa legislação é muito mais rígida comparada a deles. Aqui, é preciso destinar 20% da propriedade para a reserva legal nas regiões Sul e Sudoeste. Já o Centro-Oeste, esse percentual é de 35%”, exemplifica o engenheiro agrônomo.
O farelo de soja, usado na alimentação dos animais, é o principal produto brasileiro exportado para a União Europeia. Eles também têm comprado volumes importantes de carne do Brasil, depois vem a celulose, o café e o suco de laranja. “São produtos clássicos. A exportação de café para a Europa é centenária. O suco de laranja brasileiro é destinado para a Europa e os Estados Unidos e certas partes das carnes do frango, se dividem entre a China [pés e pernas] e Europa [peito]”.

O que vem por aí
O coordenador do Centro de Agronegócio Global do Instituto de Estudo e Pesquisa Insper, Marcos Jank, abre um parênteses para abordar um assunto que deve afetar o agronegócio do Brasil a partir de 2025. Trata-se da regulamentação europeia contra o desmatamento, proibido a aquisição de qualquer produto remanescente de área desmatada, seja legal ou ilegal. “É uma regra para o mundo inteiro e já deixa muito gente preocupada”.

Ásia, um oásis de oportunidades

A Ásia é um oásis de oportunidades do Brasil e a participação das cooperativas do Brasil e principalmente paranaenses, é fundamental para promover e estimular o avanço nas exportações. Durante o Show Rural, a Casa Paraná Cooperativo, do Sistema Ocepar, no Show Rural Coopavel, sediou o Fórum do Agronegócio Brasil/Ásia, com uma palestra proferida por Jank.
Mesmo com subsídio do governo e com 40% de sua população morando no campo, a China ainda é dependente de muitos produtos do agro. E é isso que abre caminhos para as exportações brasileiras. Atualmente, as maiores carências de produtos são de milho, algodão, açúcar, carne bovina e soja. “Temos espaço para aumentar as nossas exportações para o mercado chinês”, destaca Jank, acrescentando que somente em relação aos grãos, os chineses consomem por ano 800 milhões de toneladas.
Diante dessa necessidade de exportação para suprir a carência alimentar do seu povo, os chineses já acenam com a possibilidade de construir canais para irrigar as suas lavouras e com isso, aumentar a área produtiva. Essa preocupação dos chineses em contar com estoques satisfatórios de alimentos tem uma explicação. Eles não querem viver novamente os episódios da década de 1960, quando 36 milhões de pessoas morreram de fome. Hoje, a China conta com 500 milhões de idosos, ao contrário da Índia, outra potência mundial, mas que, na escala de faixa etária de habitantes, tem uma população mais jovem.
A China também apresenta uma retração econômica, evoluindo apenas entre 4% e 5% ao ano. “Estão entrando em um processo de deflação”, aponta Jank. Outro desafio é fazer com que o consumo per capita chinês suba próximo dos patamares brasileiros. Enquanto no Brasil, a média de consumo per capita de carne bovina é de 25 quilos ao ano, na China, não passa de 4 quilos.
O Fórum do Agronegócio Brasil/Ásia contou com as presenças do secretário da Agricultura e Abastecimento do Paraná, Norberto Ortigara; do presidente da Cooperativa Agroindusrial Lar, Irineo da Costa Rodrigues; do presidente da Frimesa, Elias Zidek; do coordenador do ramo Agro da OCB (Organização das Cooperativas Brasileiras), João Prieto e do superintendente da Ocepar, engenheiro agrônomo Robson Mafioletti.

Crédito foto: Vandré Dubiela