A medicina, desde seu início, com a necessária escuta profissional atenta do paciente, necessitava de uma anotação para a compreensão mais profunda das queixas apresentadas para entender o processo das doenças. As queixas se repetiam, e assim se encaixavam em determinada patologia. Da mesma forma, era necessário descrever o que se sabia, pela escrita, para formar novos médicos, que dariam a continuidade do tratamento.
No local onde vivia o médico tinha também um emaranhado de preceitos sociais, culturais, econômicos e religiosos, e isso influenciava nas prescrições e aspirações terapêuticas. Sublimando o aspecto profissional, médicos escreviam poemas, contos, crônicas e romances. No passado, Laennec, o fundador do “methodo auscultatório” (estetoscópio), cultivou as musas, tendo mesmo escrito poemas na mocidade.
Claude Bernard, o célebre fisiologista, teve o seu lugar garantido na Academia Francesa, não só como representante das ciências médicas, mas como escritor de alma. A sua “Introdução ao estudo da medicina experimental” é considerada, pela pureza da língua e beleza do estilo, uma das joias da literatura francesa. Richet, notável fisiologista, escreveu sobre Pasteur, em disputa com os melhores poetas do seu tempo, um poema que foi premiado pela Academia Francesa. Em Cascavel, dois médicos foram fundadores da Academia Cascavelense de Letras: Márcio Couto e Helena Lúcia Sória.
o médico e o poeta
Márcio Couto
marinheiro
de tantos portos
e navios
– por onde andei
carreguei um médico
(além do poeta)
e seu estetoscópio
os anos foram tantos
que pareceram várias vidas
– centenas, milhares
de suspiros de recém-chegados
ou, às vezes, recém-partidos
o mesmo sopro
a mesma força vital
com diferentes intensidades