Opinião

Coluna AMC: Hora da Virada

Coluna AMC: Hora da Virada

Há um planeta no sistema solar chamado Terra. O único a abrigar vida biológica, até onde se saiba. Neste planeta vive uma espécie que, por sinal, se considera a mais evoluída do mesmo. São chamados de humanos e atualmente existem aos bilhões. Num tempo relativamente curto essa espécie dominou o planeta com sua inteligência e capacidade de fabricar coisas e melhorar a própria vida, utilizando-se de quase tudo que este lugar pode oferecer em termos de recursos naturais.

Pois bem, toda vez que o planeta completa uma volta ao redor do sol ao qual orbita, esses humanos comemoram e chamam de “passagem de ano”. Eles inventaram uma coisa chamada calendário. Uma espécie de tábua que organiza seus dias e conta o tempo. Dias, semanas, meses, anos e décadas e por aí vai. Um número substitui outro de forma crescente. Isso passou a ser contado a partir de uma data especial para a maioria desses humanos. Mas acredite, existem várias outras formas de contar esse mesmo tempo. No entanto, para efeito de celeridade, não vamos entrar nesse tipo de explicação.

Réveillon, virada do ano, ano-novo são outros nomes dessa dita data especial. Esses humanos costumam se reunir para a comemoração. Neste momento eles vestem roupas novas, tomam bebidas alcóolicas e fazem uma refeição especial. Alguns deles acreditam que a cor da roupa que estão usando, vejam vocês, tem o poder de influenciar suas vidas nesse novo ano, determinando uma melhor sorte nos momentos vindouros. Incrível não?

Eles gostam muito de fazer uma contagem regressiva, utilizando relógios (outra invenção deles), quando faltam poucos segundos para a tal virada. Olhando do espaço, não parece fazer sentido algum, mas para eles faz muito. No exato minuto em que o ano novo começa esses humanos, podemos chamá-los de pessoas também, se abraçam e se cumprimentam como se isso não pudesse ocorrer sem a presença delas, sendo que o planeta já deu essa mesma volta milhões e milhões de vezes antes mesmo delas existirem.

Fogos de artifício iluminam os céus do planeta em uma miríade infinita de cores e barulhos de explosão. O novo ano começa e os dias novamente voltam a ser mais “comuns” e sua sequência registrada na tábua do calendário, até a chegada do próximo ano.

Interessante que eles parecem esquecer subitamente da importância do tempo, apenas algumas horas depois da virada. Passam a observar as suas vidas e os acontecimentos de uma forma mais imediata e apressada. Se irritam mais facilmente, com mínimas coisas. Xingam, gritam e esperneiam.

Parecem esquecer que o tempo, invenção deles mesmos, não volta atrás. Que tudo está conectado. Que há uma simplicidade gigantesca e uma harmonia que dispensa relógios e calendários. Que a vida é algo tão valioso e que ela está por toda parte. Que a morte um dia irá chegar, não importa o que façam. Essa desatenção costuma gerar muita angústia mais cedo ou mais tarde, mas não são todos que percebem.

A hora da virada, esta é a grande verdade, é a qualquer momento para aqueles que estão atentos. Cumprimentos a abraços podem ser dados todos os dias. Demonstrações de respeito e amor também. Não precisam de roupas bonitas, bebidas e comidas elaboradas para saber disso. A hora da virada vem sempre e está todos os dias batendo na porta. É uma presença discreta e perene chamando para uma vida mais plena e sem tantos sobressaltos. A hora da virada segue o rumo silencioso deste pequeno planeta e de seus bilhões de habitantes que esperam por mais uma volta no sol.

Carlos Eduardo dos Santos Martins – Anestesiologista CRM/PR–20965.